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SNS: Sim é possível

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Maria Augusta Sousa

Enfermeira

Ex-Bastonária da Ordem dos Enfermeiros

Na reflexão que aqui partilho tenho como ponto de partida o que entendo ser por todos os democratas no nosso país admitido, ou seja, O SNS é a maior conquista que os 50 anos de democracia permitiu construir e consolidar

Foi com este escopo, num quadro de construção do estado social baseado na solidariedade como pilar da equidade e da coesão social que o SNS é um dos principais instrumentos.

Foi com este importante instrumento e com definição de prioridades nas respostas às necessidades em saúde da população nos coloca, com menos recursos em alguns indicadores em paralelo, ou mesmo ultrapassando, países com um nível de desenvolvimento socioeconómico mais elevado que Portugal. 

Quão longe estamos do flagelo da mortalidade materno-infantil e da média da esperança de vida da década de 70. Mas também na luta contra as doenças infeciosas como as maiores causas de morte.

Mas também das frágeis instituições de saúde, de pequenos hospitais das Misericórdias em todos os distritos para hospitais públicos com capacidade de reposta polivalente, de casas do povo e SMS para alguns para centros de saúde para todos, de um plano de vacinação limitado para um alargamento que permitiu a eliminação ou o controlo de 14 doenças infeciosas.

Muito mais poderíamos aqui reportar por isso

SIM – o SNS é possível!

5 razões permitem afirmá-lo porque:

1 – É nos serviços públicos que a maioria dos portugueses encontram resposta para os seus problemas de saúde;

2 – É a maior rede de prestadores de cuidados de saúde de base solidária que contribui para a coesão social;

3 – É a rede pública suportada pelos impostos que cada um de nós paga de acordo com os seus rendimentos

4 – É onde, quando nos dirigimos a uma urgência ou a um centro de saúde, não nos perguntam se temos algum seguro ou se podemos pagar uma cirurgia, uma consulta, um internamento ou um domicílio da enfermeira ou do médico;

4 – É onde os cidadãos podem confiar na formação permanente dos profissionais que são a garantia da qualidade dos cuidados que lhe são oferecidos;

5 – É onde os profissionais não estão subjugados à pressão de realização de atos para rácios de produtividade como se a saúde fosse um negócio.

Por isso afirmamos para cumprir a Constituição da República no direito à saúde só o SNS público pode garantir o acesso universal, geral e tendencialmente gratuito. 

Contudo em democracia nada é adquirido se não a soubermos regar permanentemente com os valores de que ela se nutre. 

Assim para que continue a ser possível o SNS público e não permitir retrocesso é imperativo e urgente a sua transformação e reforço no sentido de responder às novas realidades demográficas, epidemiológicas e climáticas que ao cruzarem-se – uma população mais idosa e portadora de comorbilidades e surtos epidemiológicos mais frequentes – exige e é possível.

Para tal, entre outros aspetos, é necessário:

– Alteração no paradigma organizacional suportado no plano individual de cuidados, como instrumento de decisão participada e partilhada e garantia de cuidados de saúde centrados nas necessidades das pessoas e nos resultados a atingir;

– integração e continuidade de cuidados que não pode ser confundida com integração de serviços hoje determinada por lógicas de reprodução de mecanismos de cada organização que não se comunicam e fortemente condicionadas pela organização dos profissionais com bloqueios às respostas que só equipas multiprofissionais centradas nos resultados em saúde pode garantir;

– Reforço de cuidados de proximidade, garantindo as respostas necessárias à maioria das situações de saúde/doença lá onde as pessoas vivem e trabalham;

Valorização de todos os profissionais que são o garante das repostas às necessidades com o aproveitamento integral e complementar dos saberes e competências;

– autonomia e responsabilidade da gestão que deve ser participada pelas comunidades e profissionais na definição de estratégias loco-regionais e com planos plurianuais com o financiamento necessário ao cumprimento dos compromissos assumidos e com a necessária   afetação de recursos humanos quer para a prestação de cuidados e gestão como para a formação e investigação assim como de investimento em instalações e equipamentos.

Estou certa de que passados estes 50 anos somos muitos os que acreditamos que o SNS: sim é possível mas também identifico o perigo de retrocesso quando intencionalmente se usa uma terminologia que procura confundir Sistema Nacional de Saúde com Serviço Nacional de Saúde procurando, demagogicamente, fazer crer que é o mesmo o que facilmente   facilita a lógica de enfraquecimento do SNS, com a consequência de diminuição de resposta e a ilusão de que financiando o privado as respostas ficam asseguradas  vinculação deste modo a transformação do SNS à desconstrução da sua natureza pública e solidária.

Continuar, resistir e persistir é a única via possível para que o SNS continue possível.

Cacem, 5 de Março 2024

 

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