
Estamos cada vez mais envelhecidos e isolados. Os bancos de tempo podem ser a solução
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Os bancos de tempo, em que se paga com tempo e ajuda em atividades em vez de dinheiro, podem ser a solução para combater o isolamento social e a necessidade de cuidados dos idosos num mundo envelhecido.
Cuidar de idosos a longo prazo é um desafio para todos. Os custos são elevados e a qualidade do serviço é, na melhor das hipóteses, imprevisível e muitas vezes deixa a desejar.
O sistema de saúde dos EUA é tão complexo que chega a ser frustrante para os especialistas. Mesmo quando as pessoas que precisam de ajuda nas atividades da vida diária – como vestir-se, preparar refeições e tomar banho – recebem os cuidados necessários, podem ainda assim sofrer de isolamento social. E isso pode causar um desgaste emocional implacável nos cuidadores, sejam eles familiares ou profissionais com formação.
Um grupo de investigadores que trabalha com governos, empresas e organizações sem fins lucrativos procura soluções inovadoras para problemas sociais urgentes, como o envelhecimento da população e a crescente necessidade de cuidados continuados.
Na sua investigação contínua, estão a explorar um conceito promissor que pode aliviar alguns destes fardos: o banco de tempo, um sistema de ajuda mútua baseado na comunidade que considera o tempo de todos igualmente valioso.
Uma mudança demográfica global
Em 2050, uma em cada seis pessoas no mundo terá mais de 65 anos, um aumento em relação a uma em cada 11 em 2019, segundo as projeções das Nações Unidas. No final da década de 2070, o número de idosos poderá ultrapassar o de crianças com menos de 18 anos pela primeira vez na história da humanidade.
Cuidar de um número crescente de idosos com um número cada vez menor de jovens é dispendioso e complexo. Uma sondagem da Kaiser Family Foundation, realizada em 2022, revelou que 90% dos inquiridos não tinham capacidade para suportar o custo anual estimado em 100 000 dólares para cuidados em lares de idosos, e mesmo o custo aproximado de 60 000 dólares para assistência domiciliária estava fora do alcance da maioria das famílias americanas.
Estes elevados custos são agravados pela crescente escassez de cuidadores profissionais. O Departamento de Estatísticas do Trabalho dos EUA estima que quase 9 milhões de novos profissionais de cuidados diretos, como auxiliares de enfermagem, cuidadores domiciliários e auxiliares de cuidados pessoais, serão necessários na próxima década para satisfazer as necessidades das pessoas que necessitarão destes serviços. Um inquérito de 2023 da American Health Care Association revelou que 77% dos lares de idosos enfrentam falta de pessoal e 95% relatam dificuldades em contratar.
Origens do banco de tempo
O banco de tempo surgiu no Japão em 1973, através do trabalho de Teruko Mizushima, uma dona de casa que se tornou ativista social. Posteriormente, foi popularizado nos Estados Unidos por Edgar Cahn, um advogado que dedicou a sua vida a tornar a sociedade mais justa.
A ideia é simples: uma hora de ajuda equivale a um crédito de tempo, independentemente da tarefa ou do seu valor de mercado.
Os membros acumulam créditos de tempo ajudando outras pessoas. As opções são inúmeras, mas aqui ficam alguns exemplos: podem levar alguém a uma consulta, preparar uma refeição ou ensinar competências básicas, como tricotar ou mudar um pneu. Depois de acumularem créditos, os participantes podem utilizá-los quando precisarem de apoio. Assim, se dedicar um total de 60 horas a ajudar outras pessoas, poderá resgatar 60 horas numa data futura, sob a forma de alguém que cuida de si.
O Banco de Trabalho Voluntário de Mizushima, em Osaka, o primeiro banco de tempo do mundo, utilizava uma moeda complementar baseada no tempo, conhecida como “moeda do amor“, que os membros podiam guardar para uso posterior ou transferir para os seus familiares.
O Hour Exchange Portland, um dos bancos de tempo mais antigos dos EUA, é um sistema em que os vizinhos trocam serviços utilizando créditos de tempo há quase três décadas. Está entre as centenas de bancos de tempo em funcionamento no país.
Em sintonia com as realidades do envelhecimento
A nova investigação foi desenvolvida para facilitar uma investigação comparativa das práticas de bancos de tempo em diferentes países e regiões. Nos últimos dois anos, foram realizadas entrevistas e grupos de foco com dezenas de participantes de bancos de tempo e adultos de meia-idade ou com mais de 65 anos nos EUA e na China.
Os resultados sugerem que os bancos de tempo podem ser particularmente úteis para resolver três problemas associados ao envelhecimento que os sistemas convencionais não conseguem abordar: a acessibilidade financeira aos cuidados, a abrangência dos cuidados e o isolamento social.
Em primeiro lugar, com o aumento do custo dos cuidados remunerados, os créditos de tempo oferecem uma nova forma de obter assistência básica sem gastar mais dinheiro. Para muitas famílias, a possibilidade de pagar com o seu tempo em vez de dinheiro pode tornar o cuidado dos seus entes queridos mais acessível.
O banco de tempo também dá visibilidade a tipos de trabalho que os sistemas baseados no mercado ignoram ou subestimam rotineiramente: apoio emocional, companhia, ajuda com pequenas rotinas diárias e explicações pacientes sobre o funcionamento das novas tecnologias. Estas formas de cuidados raramente são remuneradas, mas são essenciais para manter a independência e a dignidade.
Talvez ainda mais importante, o banco de tempo fomenta as ligações porque não se limita a recompensar as transações. Em vez disso, atribui valor a diversos tipos de interações humanas.
As entrevistas indicaram que os serviços são trocados através de uma vasta gama de atividades: praticar caligrafia com alguém, ensinar Tai Chi, ler em voz alta para alguém com deficiência visual ou contactar um vizinho para o lembrar de tomar os seus medicamentos.
Estas trocas têm menos a ver com competências especializadas e mais com o apoio mútuo. Alargam o ecossistema de cuidados e lembram aos idosos que continuam a ser membros essenciais das suas comunidades.
Quando os idosos participam em bancos de tempo, sentem-se vistos, úteis e integrados no tecido da vida comunitária.
Um caminho a seguir
Criar bancos de tempo que facilitem a gestão das responsabilidades de cuidados aos idosos por parte das famílias exigiria a superação de diversos desafios.
Alguns são inerentes aos bancos de tempo. Por exemplo, é difícil manter níveis elevados de participação, satisfazer as diversas necessidades dos membros de um banco de tempo, reduzir os riscos de alguns membros explorarem o sistema e suportar os custos administrativos.
Outros desafios são mais específicos ao cuidado dos idosos. Por exemplo, pode não ser viável manter a reciprocidade entre os membros, uma vez que aqueles que são frágeis tendem a receber os serviços do banco de tempo e não conseguem retribuir com facilidade.
Mas, ao analisar os prós e os contras de vários modelos, a equipa de investigação espera desenvolver um modelo de banco de tempo adaptado aos cuidados a idosos.






