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Saúde dos Profissionais de Saúde: O Elo Mais Fraco do Sistema em Portugal

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O relatório da OCDE revela uma crise silenciosa a minar o SNS: o esgotamento extremo dos seus profissionais. Com 47% dos médicos e 52% dos enfermeiros com burnout, Portugal destaca-se negativamente na Europa. Este não é apenas um problema de bem-estar individual, mas uma ameaça direta à qualidade e segurança dos cuidados de saúde prestados à população

A saúde de um sistema de saúde depende diretamente do bem-estar dos seus pilares humanos. Em Portugal, estes pilares estão a rachar. Os dados do relatório “Health at a Glance 2025” da OCDE pintam um quadro alarmante: 47% dos médicos e 52% dos enfermeiros em Portugal manifestam sintomas de burnout, valores que não só superam a média europeia como colocam o país num patamar crítico de esgotamento profissional. Esta não é uma mera estatística laboral; é o diagnóstico de uma doença sistémica que compromete a resiliência e a eficácia do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

A crise silenciosa entre os profissionais de saúde em Portugal reflete-se não apenas nos indicadores de saúde mental, mas também nas condições concretas de trabalho que enfrentam diariamente. A escassez crónica de profissionais – um problema estrutural reportado pela OCDE – cria um ciclo vicioso de sobrecarga. Um enfermeiro num serviço de urgência de um hospital da região de Lisboa descreve a realidade: “Trabalhamos sistematicamente com o dobro dos doentes que deveríamos acompanhar, sem tempo para os cuidados básicos. O cansaço é tanto que, por vezes, o ato de lavar as mãos, crucial para prevenir infeções, se torna um esforço hercúleo.” Esta pressão constante tem repercussões mensuráveis e graves: estudos citados no contexto do relatório indicam que a taxa de erros médicos e de eventos adversos aumenta 23% quando os profissionais trabalham além do seu limite físico e mental, colocando em risco a segurança do doente.

A comparação com outros países europeus, como a Finlândia, é elucidativa e demonstra que existem alternativas. Enquanto em nações como a Finlândia a legislação estabelece ratios máximos de doentes por profissional, garantindo tempos de consulta e acompanhamento adequados, em Portugal estas normas ou não existem de forma vinculativa ou não são cumpridas, fruto da pressão assistencial e da subdotação de efetivos. Esta falta de regulamentação eficaz contribui para um ambiente de trabalho caótico e desumanizante.

As consequências deste ambiente tóxico não se ficam pelos muros dos hospitais. O esgotamento é um dos principais motores da fuga de cérebros para o setor privado e para outros países europeus, que oferecem melhores condições salariais, carga horária mais leve e maior valorização profissional. Esta hemorragia contínua de talento e experiência agrava ainda mais o problema dos que permanecem no sistema público, aumentando a sua carga de trabalho e acelerando o seu próprio esgotamento. É um ciclo perverso de desgaste que debilita o SNS. Um investigador em saúde ocupacional da Universidade do Porto alerta: “Estamos a queimar o capital humano mais valioso do nosso sistema de saúde. Estamos a sacrificar uma geração de profissionais altamente qualificados, e a reposição deste capital não é imediata. Os danos serão sentidos durante anos.”

A solução, como aponta a análise da OCDE, exige uma abordagem multifacetada e urgente, que vá além de medidas pontuais. É imperativo:

  1. Rever os modelos de organização do trabalho: Implementar ratios seguros de doentes por profissional, tal como praticado noutros países, e repensar os turnos e a distribuição de tarefas para reduzir a exaustão.
  2. Investir em programas de apoio psicológico: Criar serviços de saúde mental e apoio psicológico específicos e confidenciais para profissionais de saúde, destigmatizando a procura de ajuda.
  3. Fortalecer a liderança e a cultura organizacional: Promover uma cultura de apoio e reconhecimento dentro das instituições de saúde, onde os profissionais se sintam valorizados e ouvidos.
  4. Apostar na formação e retenção de talentos: Melhorar as perspetivas de carreira e as condições remuneratórias para travar a fuga para o estrangeiro e para o setor privado.

Em suma, a saúde dos profissionais de saúde não é um benefício marginal, mas um pré-requisito fundamental para a sustentabilidade do SNS. Investir no seu bem-estar é, em última análise, investir na saúde de todos os portugueses. Ignorar este elo mais fraco é condenar todo o sistema a uma rutura anunciada.

Fonte: OCDE (2025), Health at a Glance 2025: OECD Indicators, OECD Publishing, Paris. https://doi.org/10.1787/8f9e3f98-en

NR/OCDE/HN

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