
Se é verdade que mais vale prevenir que remediar, porque será que se gasta tão pouco em prevenção?
António de Sousa Uva: médico e professor
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Mantém-se, segundo alguns dos indicadores do Health at a glance 2025 da OCDE agora conhecidos, o paradoxo daquela vantagem desse ditado popular não se repercutir nas despesas em saúde. Em Portugal essas despesas na prevenção resumem-se a pouco mais de 2 a 3% dos gastos em Saúde. Há, portanto, uma retoma dos valores pré-pandemia, que então quase duplicaram essa proporção, e se mantêm, sem grandes alterações, nos países da OCDE há mais de uma década. No entanto, países como o Canadá, que despendem cerca de três vezes esse valor têm resultados custo-efetivos, por exemplo, na prevenção de algumas doenças crónicas.
É um contexto pouco “amigável” de áreas que se dedicam à prevenção, por exemplo, das influências negativas do trabalho sobre a saúde que, no caso dos prestadores de cuidados, também pode influenciar negativamente essa prestação, designadamente, em matéria de segurança do doente. Por exemplo, que importância terão essas influências em cerca de 10% (ou mais) de probabilidade de ocorrerem eventos adversos naquela prestação em unidades de saúde hospitalar?
De facto, a Saúde e Segurança do Trabalho (ou a Saúde Ocupacional, se for preferível, ou até mesmo a Segurança, Higiene e Saúde dos trabalhadores nos Locais de Trabalho) abrange uma profusa pluralidade disciplinar, mesmo na estrita abordagem da prevenção das denominadas “doenças ligadas ao trabalho” que é, consequentemente, indispensável em qualquer modelo de organização. O conceito de “doença ligada ao trabalho” engloba todas as formas em que o trabalho pode interferir na saúde, em termos de efeitos adversos, independentemente da sua influência se situar na causa, na evolução, no desfecho ou no agravamento de lesões ou doenças.
O recente surto pandémico relevou, de forma indissipável, a importância dos diversos prestadores de serviços, incluindo os cuidados de saúde, numa emergência de Saúde Pública. Revelou, também, um “novo olhar” para o binómio homem/trabalho, em que os factores de risco psicossociais, que entretanto têm vindo a obter um “infeliz” protagonismo entre os factores de risco de natureza profissional, adquiriram uma enorme importância. Por exemplo, quase metade dos médico(a)s e enfermeiro(a)s revelaram (e ainda revelam) elevada exaustão profissional e emocional e alguns revelam mesmo sinais de despersonalização, com os potenciais efeitos negativos na prestação de cuidados com desfecho negativo, também potencial, nos resultados dessa prestação.
Os aspetos de Saúde Mental (ou da sua falta) dos trabalhadores, para além de causarem muito sofrimento em quem os vivencia, representam custos económicos elevadíssimos (diretos e indiretos) que deveriam determinar a implementação inadiável de mais eficazes políticas públicas visando a sua prevenção. Apesar disso, eterniza-se a perspetiva, mais assente na forma do que no conteúdo, de dotar as empresas e outras organizações de meios da organização do trabalho e de proteção da saúde dos trabalhadores na sua dimensão, digamos, mais administrativa que substantiva.
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