
Estudo mostra que 70% dos portugueses admitem falta de afeto nas suas relações

Os portugueses admitem insatisfação com a forma como vivem os afetos: 70% dos cidadãos nacionais reconhecem que, dentro do seu círculo familiar, a afetividade não está a ser plenamente experienciada.
Esta é uma das principais conclusões daquele que é considerado o primeiro estudo científico sobre os afetos, em Portugal, com coordenação do psiquiatra Daniel Sampaio.
Os dados vêm alertar para a necessidade de agir de forma preventiva na área da saúde mental, acentua o psiquiatra, em declarações à Renascença.
“Devemos estar preocupados, mas atuar de uma forma positiva na esfera preventiva porque as dificuldades de relacionamento, a falta de amor, a sensação de que não se é gostado, têm implicações no aparecimento, mais tarde, de perturbações mentais. Em particular a ansiedade e a depressão”, aponta.
O estudo intitulado “Os portugueses e os seus afetos, será que nos entendemos?”, realizado pela consultora Return on Ideas, revela que muitos portugueses desejam relações mais próximas e afetivas, mas assumem grande dificuldade na forma de expressar afeto. Exemplo disso é o facto de 64% dos inquiridos sentirem que a sociedade está menos empática do que há cinco ou 10 anos.
“A empatia é fundamental. É o reconhecimento do outro, a possibilidade de nós sentirmos o que o outro está a sentir. Portanto, se as pessoas sentem que há menos empatia, significa que estão com algumas dificuldades relacionais. Além disso, 48% dos inquiridos sentem que devem ser mais afetuosos, isto é quase metade das pessoas. O estudo demonstra que temos um problema que necessita de atenção”, declara.
A infância e a adolescência são fases importantes para estabelecer relações recíprocas, por isso o professor catedrático jubilado de Psiquiatria e Saúde mental defende mais apoios para os pais lidarem com os filhos.
“Logo na infância, os três primeiros anos de vida são fundamentais. Portanto, temos de melhorar a capacidade que os pais têm de tomar conta dos seus filhos bebés, aumentar a licença parental, ter melhores condições de vida para os pais. O estudo também demonstra claramente que a adolescência é uma época de tensão em que muitos pais precisam de ser ajudados a lidar com as situações dos filhos. Existe uma franja de adolescentes, que se calcula à volta de 20%, que tem problemas de saúde mental”, adverte.
Nesse sentido, o psiquiatra avança com exemplos de algumas medidas públicas que deveriam ser implementadas.
“Na adolescência, as autarquias podiam criar grupos de pais para que os psicólogos das autarquias pudessem ajudá-los no relacionamento adolescente. Por outro lado, há muitos divórcios entre os casais e também seria importante, a nível da terapia de casal, termos respostas do Serviço Nacional de Saúde. Se houver uma intervenção cedo, nós podemos prevenir divórcios com todas as consequências negativas que existem, quando há filhos”, sugere.
Aumentar o número de psicólogos nos centros de saúde é outra das medidas defendidas por Daniel Sampaio que aponta também que as novas dinâmicas tecnológicas trazem uma outra gramática afetiva que pode ser problemática.
“Nas redes sociais exprimem-se mensagens de amor, mas também muitas mensagens de ódio. A educação para a internet é algo que deve ser feito logo na infância porque já há bebés com o telemóvel. Tudo o que seja adiar e organizar o contacto com os ecrãs é oportuno e urgente”, indica.
Apesar de tudo, há caminhos para melhorar a pedagogia emocional e a qualidade afetiva. A relação com os avós, uma refeição à mesa ou o simples ato de cozinhar em conjunto são boas oportunidades para uma saudável partilha de afetos.
“Os avós, hoje em dia, têm mais saúde e mais possibilidades de estar junto dos netos. É uma relação muito mais fácil, muito mais lúdica para poderem amar os seus netos, desde que os netos apareçam porque é importante dizer aos mais novos que devem aparecer junto dos mais velhos. Há também outros dados interessantes como cozinhar em conjunto ou escolher alimentos para a hora de jantar. São formas de conexão dos casais e também de pais e filhos”, lembra.
A investigação “Os portugueses e os seus afetos, será que nos entendemos?” mostra ainda que em casa, o desejo de aproximação convive com algumas barreiras. 44% referem alguém próximo com quem gostariam de fortalecer a ligação.
Nas relações amorosas, a dificuldade em comunicar diretamente desconfortos intensifica frustrações, sobretudo entre as mulheres.
O estudo conclui que os afetos estão presentes, mas há espaço para serem mais vividos.
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