
A Europa está a virar as costas aos agricultores?

A equipa de verificação de dados da Euranet Plus – rede europeia de rádios de que a Renascença faz parte – conclui que o apoio e a atenção que a União Europeia (UE) dá, atualmente, à agricultura tem estado na origem de desinformação e de informações erradas nas redes sociais, alimentando a desconfiança em relação aos organismos europeus. No seu mais recente relatório, analisa o que tem sido publicado sobre o tema e sinaliza que a agricultura continua a ser uma aposta da UE, com fundos a serem disponibilizados aos produtores e com medidas para simplificar o acesso aos mesmos. No entanto, mantém-se em queda o valor que é atribuído pelas instâncias europeias ao setor.
O orçamento de longo prazo do bloco para o período entre 2028 e 2034, proposto pela Comissão Europeia e que está a ser debatido no Parlamento Europeu e pelos ministros da Agricultura e Pescas, é anunciado como o maior de sempre, no entanto, a proporção destinada especificamente à produção agrícola é a menor em décadas.
O relatório da Euranet Plus destaca que o “Quadro Financeiro Plurianual (QFP) proposto para 2028-2034 tem um orçamento total de quase 2 biliões de euros, o que representa um aumento em relação aos 1,2 biliões atribuídos no período 2021-2027”, ainda em curso.
Desta verba, cerca de 300 mil milhões de euros são destinados à Política Agrícola Comum (PAC), o que “representa uma diminuição em relação aos 387 mil milhões de euros do período anterior”. A Euranet Plus conclui que segue, assim, “uma tendência de diminuição das despesas da PAC”, embora, para além do financiamento da política agrícola, proponha também uma rede de segurança no valor de 6,3 mil milhões de euros (900 milhões de euros por ano), destinada a fazer face a crises de mercado, incluindo perdas causadas por pragas e doenças animais.
Neste QFP, Portugal recebe 33,5 mil milhões de euros, incluindo para a coesão e agricultura, no âmbito do plano de parceria nacional e regional ao abrigo do novo orçamento. Deste montante, o Executivo comunitário sugere alocar aproximadamente 7,4 mil milhões de euros para a PAC em Portugal e 143 milhões de euros para as pescas.
Apesar de a agricultura ter tido um papel cada vez menos importante na economia europeia nos últimos 30 anos, a equipa de verificação de dados da Euranet Plus recusa que o setor esteja a ser esquecido pela UE, até porque, para além do esforço para simplificar a forma como os agricultores são compensados e podem concorrer a esses apoios, o setor “continua a ser uma força estável, contribuindo com 1,3% para o Produto Interno Bruto da UE em 2024”. Sete países – França, Alemanha, Itália, Espanha, Países Baixos, Polónia e Roménia – foram responsáveis por três quartos (76,5%) do valor total estimado da produção agrícola do mercado comum no ano passado.
Acordo com o Mercosul: oportunidade ou risco?
Entretanto, o projeto de acordo UE-Mercosul, entre o bloco europeu e a Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai, tem alimentado receios de que possa prejudicar os agricultores do velho continente, uma vez que terão de competir com importações sujeitas a padrões e custos mais baixos. No entanto, a equipa de verificação de dados da Euranet Plus lembra que um acordo semelhante celebrado com o Canadá em 2017 não teve impactos negativos nos mercados europeus de carne bovina, com as importações a respeitarem uma quota de 3%, segundo o Centro Europeu de Economia Política Internacional.
No relatório de novembro, a equipa da Euranet Plus escreve que o acordo especifica que “as empresas da UE deverão poupar 4 mil milhões de euros em direitos de exportação por ano”, além de que “os exportadores do Mercosul terão de cumprir rigorosamente as normas de saúde e segurança alimentar para aceder ao mercado da UE”.
As previsões apontam para que o entendimento com estes países “possa aumentar as exportações anuais da UE para o Mercosul em até 39%, apoiando mais de 440 mil postos de trabalho em toda a Europa”. Já as exportações meramente agroalimentares da UE para o Mercosul poderão crescer “quase 50%, através da redução das tarifas sobre produtos essenciais como o vinho e as bebidas espirituosas, o chocolate e o azeite”.
Mesmo assim, a equipa de fact-checking da rede europeia de rádios de que a Renascença é parceira, lembra que “durante os protestos dos agricultores em 2024, o Observatório Europeu de Media Digital constatou um aumento da desinformação sobre o assunto, exagerando o apoio recebido pelos agricultores, exacerbando sentimentos negativos em relação às instituições da UE e espalhando narrativas falsas sobre alimentos”.
Perigos identificados
No entanto, há riscos identificados por organizações credíveis. Embora muitos especialistas afirmem que a UE tem muito a ganhar com acordos comerciais como o Mercosul, o grupo de reflexão Atlantic Council alertou que a polarização política em cada país pode ofuscar os ganhos económicos. Já a Confederação Europeia dos Sindicatos defende que o acordo carece de proteções para os trabalhadores e não oferece qualquer cláusula laboral aplicável ou sanções para as empresas que violam os direitos dos trabalhadores. Por último, a Organização Europeia dos Consumidores sublinha que estes também estão em risco, uma vez que o acordo permite a importação de alimentos que não cumprem totalmente as normas da UE em matéria de ambiente, segurança alimentar e bem-estar animal.
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