
Acolher é cuidar: um manifesto pela saúde que nos une
Cristina Vaz de Almeida: Presidente da Sociedade Portuguesa de Literacia em Saúde
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Num tempo em que o mundo parece levantar muros, o programa “Acolher” constrói pontes. Não distingue entre “nós” e “eles”, entre “nacionais” e “estrangeiros”. Reconhece que a saúde e o bem-estar não tem fronteiras: nem partidárias, nem geográficas.
A saúde não é um território político, é um território humano. E é nesse território que o “Acolher” faz a diferença: não substitui o sistema, mas complementa-o, preenchendo lacunas, humanizando respostas, criando proximidade onde antes havia distância, juntando parceiros das várias áreas da saúde, social, educação, cultura e outras. Porque a literacia em saúde é também isto: compreender, traduzir, explicar, capacitar. É transformar a informação em inclusão. É dar voz a quem raramente é ouvido.
O sistema deve cada vez mais adaptar-se ao individuo e não o contrário. As pontes, as ligações harmoniosas para a tomada de decisões em saúde e a sua vigilância permitem criar redes de cooperação e de solidariedade humana. Capacitar é robustecer as sociedades, tornando os frágeis menos frágeis e os mais fortes capazes de partilhar para reforçar as sociedades.
Há palavras que transformam. “Acolher” é uma delas. Quando acolhemos, reconhecemos o outro como alguém que merece estar. E quando o fazemos através da saúde, estamos a dizer, sem precisar de o dizer, que todas as vidas contam. O projeto “Acolher”, da Sociedade Portuguesa de Literacia em Saúde (SPLS), nasce dessa certeza simples e profunda: a saúde é um direito universal e um dever de solidariedade.
Em parceria com múltiplas instituições e profissionais das mais diversas áreas e setores, numa perspetiva multidomínio, interdisciplinar e multiprofissional, o programa Acolher leva intervenções de saúde e rastreios comunitários a refugiados e migrantes em todo o país — pessoas que chegaram a Portugal em busca de segurança, dignidade e esperança. E, muitas vezes, o primeiro gesto de verdadeiro acolhimento que recebem é justamente este: alguém que escuta, examina, orienta e cuida.
Mas “Acolher” não é apenas um projeto. É uma forma de estar. De norte a sul do país, equipas de profissionais e voluntários percorrem centros comunitários, abrigos, escolas, bairros e associações, levando consigo conhecimento, empatia e presença.
Entre eles há médicos, enfermeiros, psicólogos, farmacêuticos, assistentes sociais, estudantes e cidadãos que acreditam que a saúde se constrói no encontro — e que ninguém deve ser deixado para trás, independentemente da língua, da origem, do estatuto ou da cor da pele.
Há pessoas que vivem com VIH, há mães grávidas que precisam de acompanhamento, há pessoas idosas com doenças crónicas, há crianças que ainda não conhecem o sistema de saúde português.
Cada rosto é uma história. E cada história é uma oportunidade de criar confiança, de devolver autonomia, de capacitar para melhores decisões em saúde, de melhorar a qualidade de vida e de bem-estar, de transformar a literacia em saúde numa ponte real entre quem cuida e quem precisa.
Este projeto é um exemplo vivo do que o país pode ser quando a solidariedade se transforma em ação. De norte a sul, das cidades às aldeias, da costa ao interior, há uma rede de pessoas que se junta em nome da saúde para que ninguém, em território português, fique sem acesso ao mais básico dos direitos humanos: o direito a ser cuidado.
Num tempo em que o debate público tantas vezes se faz de divisões, o “Acolher” mostra-nos o contrário: que é possível unir. Que a saúde é o ponto de encontro possível entre todos. Que cuidar é o verbo mais revolucionário e mais simples de todos. Porque acolher é olhar o outro e dizer: “A tua vida importa”. E enquanto houver quem o faça, nos bairros, nas clínicas, nas escolas, nas comunidades, haverá esperança.
O “Acolher” é, no fundo, isso mesmo, um espelho do país que queremos ser: solidário, informado, humano, capaz de transformar a empatia em política pública e a ciência em proximidade. Um país onde a saúde é o idioma comum de todos nós.
MANIFESTO SUBSCRITO PELA SOCIEDADE PORTUGUESA DE LITERACIA EM SAÚDE E SEUS PARCEIROS.
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