
Líder parlamentar do PS desafia esquerda a fazer “avaliação” e ponderar desistências em favor de Seguro
O líder parlamentar do PS, Eurico Brilhante Dias, acredita que ainda pode haver desistências de candidatos presidenciais até às eleições presidenciais de janeiro, lembrando até que o PCP já retirou, no passado, o seu candidato da corrida dias antes da eleição.
Em entrevista ao Hora da Verdade, da Renascença e do Público, o líder da bancada socialista sublinha que a esquerda tem agora uma oportunidade de conquistar Belém e não a deve desperdiçar. Sobre o apoio formal do PS a António José Seguro, garante que foi “no momento certo” e confia que Augusto Santos Silva até vá votar no antigo secretário-geral.
[esta é a segunda parte da entrevista a Eurico Brilhante Dias, pode ler a primeira aqui]
Acredita que António José Seguro tem possibilidades reais de vencer as presidenciais? Ou o PS vai inspirar-se noutras corridas presidenciais em que partiu de trás e acabou por vencer?
António José Seguro é um candidato apoiado pelo PS, mas não é o candidato do PS. É um candidato suprapartidário que tem tido, felizmente, o apoio de muitos setores diferentes da sociedade portuguesa. É um candidato que tem todas as condições, primeiro, para ser um bom Presidente da República; segundo, para poder disputar com os candidatos da direita a passagem à segunda volta.
Acredito que isso será possível. Há uma mobilização clara das bases do partido no apoio a António José Seguro — clara, não unânime. Se querem partidos unânimes, terão de procurar outro que não o PS. Nós nem sequer fomos unânimes no apoio a Mário Soares em 1986. O PS é um partido plural, e essa pluralidade é uma das suas maiores forças.
Mas, havendo agora apenas um candidato presidencial apoiado pelo PS, não é estranho que haja antigos dirigentes e pessoas com cargos relevantes no partido que digam que não vão votar em António José Seguro?
Chegará o momento em que cada um dirá em quem vota.
PS tem demonstrado mais coesão e unidade do que, por exemplo, o PSD no apoio a Luís Marques Mendes
Santos Silva já disse que não votará.
Eu não sei se ele disse que não, acho que é melhor ler com atenção o que ele disse. Mas estão sempre a fazer-me a pergunta sobre as divergências do PS. Agora, o PS tem demonstrado mais coesão e unidade do que, por exemplo, o PSD no apoio a Luís Marques Mendes. Há um ex-presidente do PSD que apoia o almirante Gouveia e Melo. Por isso, não é uma questão. Ele fará a sua campanha, não é a campanha do PS, é a campanha de António José Seguro como candidato suprapartidário. E o partido conseguiu, pela primeira vez desde 1996, considerando que em 2001 Jorge Sampaio se recandidatava, tomar uma decisão, que é uma decisão de apoio a um candidato.
Porque não conseguiram arranjar outro candidato?
Não empurramos as pessoas para serem candidatas. Só o são se quiserem e se considerarem que têm condições políticas para isso. O PS tomou a decisão no momento certo, quando o quadro de candidaturas estava estabilizado. Na comissão nacional, houve apenas duas abstenções. Procurar fraturas com base em duas abstenções parece-me excessivo.
Gostaria de ver candidatos mais à esquerda desistirem antes da primeira volta para facilitar a passagem de António José Seguro?
Essa é uma decisão que compete a cada candidato. Os portugueses sabem que o equilíbrio institucional é importante. Quem se candidata à esquerda de António José Seguro deve perceber se a sua candidatura contribui para esse equilíbrio e para termos, em Belém, um Presidente que respeite a Constituição.
Não seria a primeira vez que o PCP, perto de eleições, decide não manter o seu candidato até ao fim
Está a dizer que, se Seguro não passar à segunda volta, esses candidatos de esquerda serão responsabilizados?
É uma avaliação política que devem fazer. O mesmo se aplica ao PCP, que optou por não incluir João Ferreira na coligação em Lisboa. Não seria a primeira vez que o PCP, perto de eleições, decide não manter o seu candidato até ao fim. Não devemos transformar as eleições presidenciais numa tentativa de sobrevivência política. Isso não contribui para uma boa escolha dos portugueses.
Se a esquerda se mantiver afastada de Belém por mais dez anos, essa responsabilidade será partilhada?
Partilhada, não. O PS tomou a decisão adequada para evitar isso. Concordo com Pedro Nuno Santos quando afirmou que o PS não podia, desta vez, deixar de apoiar um candidato. Nos últimos 30 anos, o PS nem sempre tratou com o devido cuidado as eleições presidenciais. Focados na governação, por vezes desvalorizámos o papel da Presidência — e isso custou-nos caro. É tempo de a esquerda refletir sobre a importância do Presidente da República para a democracia portuguesa.
Nas eleições autárquicas em Lisboa, o PS teve menos votos do que há quatro anos. O que correu mal?
As condições de partida eram difíceis. Alexandra Leitão foi uma boa candidata e será uma excelente vereadora. Apesar de considerar que a presidência de Carlos Moedas foi fraca, ele beneficiou de fatores locais e de uma mudança demográfica na cidade.
Ricardo Leão, em Loures, alcançou uma maioria absoluta, apesar de ter sido atacado internamente por causa das habitações sociais. É agora o modelo de autarca do PS?
O Ricardo Leão não ganhou as eleições pelas suas declarações, ou apenas pelas suas declarações. Trabalhou bem nas creches, jardins-de-infância e centros de saúde. Aproveitou o Plano de Recuperação e Resiliência para realizar obra concreta. Luísa Salgueiro, Ricardo Leão e Inês de Medeiros são autarcas-modelo, cada um no seu contexto. Não há um único modelo de vitória socialista.
António Costa devia pedir-lhe desculpa pela carta em que o acusou de trair os princípios do PS?
Não entro nessas discussões. Tenho estima e consideração por ambos. O PS é um partido vivo, com debates intensos, muitas vezes apaixonados.
Sérgio Sousa Pinto pediu uma reflexão sobre a perda das maiores câmaras. Concorda?
Sim. O PS deve refletir sobre a sua relação com os jovens e com a classe média, que enfrenta problemas sérios na habitação e mobilidade. Recuperar a maioria implica novas respostas e criatividade programática. Em Almada e Évora, tivemos excelentes resultados; em Setúbal, somos a principal força da oposição. Ganhámos em territórios importantes como Viseu, Bragança e Faro.
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