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Paramédicos no sistema de Emergência Médica Pré-Hospitalar em Portugal – um futuro pouco provável

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Eduardo Bernardino: Enfermeiro; Mestre em Gestão em Saúde

Portugal optou há muitos anos por um modelo diferente e bem estabelecido, centrado no Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), com os seus próprios profissionais, os Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) e os Enfermeiros, que funcionam sob orientação médica direta.

Assim, o modelo paramédico em Portugal não poderá avançar por vários motivos:

  1. O Modelo Médico-Cêntrico e a Regulação do INEM

Controlo Médico Direto: O sistema português é altamente “médico-cêntrico”. Isto significa que as decisões críticas em ambiente pré-hospitalar são, em teoria, tomadas ou validadas por um médico. O INEM opera um sistema de orientação de chamada (via Centro de Orientação de Doentes Urgentes – CODU) onde médicos especializados em emergência médica decidem o recurso mais adequado.

Monopólio e Estrutura Estatal: O INEM é a entidade reguladora e principal provedora do Serviço de Emergência Médica. A introdução de uma nova carreira independente, como a do paramédico, exigiria uma reestruturação profunda desta instituição e da legislação que a rege.

  1. A Existência de uma Carreira Consolidada: Os TEPH

Figura Híbrida: Os Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) são os profissionais que desempenham algumas das funções de um paramédico. Eles têm uma formação específica e realizam procedimentos de suporte básico de vida e, em algumas situações, suporte intermediário.

Resistência Profissional e Sindicatos: A criação de uma nova carreira de paramédicos seria vista como uma ameaça à carreira dos TEPH. Os sindicatos e associações de TEPH opor-se-iam fortemente a uma medida que poderia desvalorizar a sua formação e experiência, ou até tornar a sua profissão obsoleta.

  1. Questões de Formação e Certificação

Formação Diferente: A formação de um paramédico nos EUA/Reino Unido é um curso superior (nível bacharelato ou equivalente), altamente padronizado e focado em autonomia clínica. Em Portugal, a formação de TEPH, apesar de robusta, é diferente em estrutura, duração e filosofia, tendo a duração de 1 ano. Não existe atualmente um curso de ensino superior (licenciatura) especificamente para paramédicos reconhecido pelo Ministério da Saúde.

Reconhecimento de Competências: O que um paramédico pode fazer num país ( entubação, administração de uma vasta gama de medicamentos) pode é, em Portugal, um ato médico ou de Enfermagem, exclusivo. A introdução dos paramédicos exigiria a redefinição legal de “atos médicos” e “atos de enfermagem” e a criação de um novo quadro de competências.

  1. Custos e Reestruturação do Sistema

Investimento: Implementar um novo modelo exigiria um investimento massivo na formação de uma nova força de trabalho, na reestruturação das carreiras no INEM e nos Bombeiros, na atualização de protocolos e equipamentos.

Duplicação de Funções: Num serviço público com recursos limitados, seria difícil justificar a criação de uma nova carreira quando já existe uma (os TEPH) que desempenha funções semelhantes, mesmo que com menos autonomia.

  1. Cultura e Tradição no Socorro

Papel dos Bombeiros: Em Portugal, os bombeiros voluntários e sapadores são pilares fundamentais do socorro pré-hospitalar, operando uma vasta frota de ambulâncias. Muitos deles são TEPH. Qualquer mudança teria de ser feita em concertação com estas corporações, que têm um peso social e histórico enorme.

Conclusão

Em vez de importar o modelo de paramédicos, o caminho mais provável e realista para Portugal deverá ser o seguinte:

1) Reforçar e Avançar a Carreira de TEPH: Aumentar a sua formação, alargar o seu leque de competências (criando, por exemplo, uma figura de “TEPH Avançado”) e melhorar as suas condições.

2) Integrar mais Enfermeiros no Sistema de Emergência Médica: O enfermeiro especialista em enfermagem de reanimação já é uma peça-chave nas VMER (Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação). A sua presença pode ser expandida. A Triagem Telefónica de Manchester é uma obrigação no futuro próximo nos CODU, uma vez que o atual sistema está completamente obsoleto. A utilização exclusiva de Enfermeiros na mesma será claramente uma mais valia na priorização de meios de socorro no dia-a-dia.

3) Modernizar o INEM: Reforçar os meios do INEM (mais VMER, mais meios aéreos) e do CODU para garantir que a orientação médica à distância é ainda mais eficaz.

Em resumo, Portugal não tem um “vazio” no socorro pré-hospitalar. Tem um modelo diferente, que é uma evolução da sua própria história e estruturas sociais. A questão não é se o modelo de paramédicos é bom ou mau, mas sim que a sua implementação em Portugal exigiria uma revolução no sistema de saúde, nas carreiras profissionais e na legislação, algo para o qual atualmente não existe vontade política nem consenso social.

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