
Mais exames e gestão de doentes crónicos: centros de saúde do SNS podem sofrer revolução
A despesa pública com a saúde atingiu níveis considerados insustentáveis e é urgente travar o ritmo de crescimento. O alerta é de António Lobo Ferreira, coordenador do grupo de trabalho criado pelo Ministério da Saúde, que defende uma gestão mais eficiente dos recursos e uma reorganização profunda do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
De acordo com o jornal ‘Público’, o relatório entregue ao Ministério propõe medidas que vão desde o reforço dos cuidados de saúde primários até à centralização das compras e da logística hospitalar, com o objetivo de “poupar dinheiro gerindo melhor os recursos”.
Entre as recomendações, o grupo defende que aumentar a eficiência poderá gerar “muitas centenas de milhões de euros” em poupanças na despesa corrente do SNS, criando espaço para discutir “reformas estruturais” que garantam sustentabilidade e qualidade no atendimento aos utentes.
Uma das medidas estruturantes passa pela criação de processos de triagem inteligente e referenciação progressiva, que encaminhem os casos simples para hospitais de proximidade e reservem as unidades mais diferenciadas para situações complexas. A ideia é reduzir as listas de espera e garantir um acesso mais rápido e adequado aos cuidados de saúde.
O relatório propõe também uma “aposta muito grande” nos cuidados de saúde primários, especialmente na capacidade de prescrição de exames. “Não faz sentido ter doentes à espera de ir fazer exames aos hospitais centrais”, sublinha António Lobo Ferreira. Segundo o grupo, permitir que os centros de saúde assumam um papel maior na gestão de doenças crónicas poderá reduzir em 15 a 20% os custos associados ao acompanhamento desses doentes, evitando duplicação de consultas e exames.
Centralização de compras e logística para evitar desperdícios
Outra das propostas prioritárias é a centralização obrigatória das compras e da logística hospitalar. Apesar de já existir uma central de compras no SNS, nem todas as aquisições passam por esse sistema. O grupo recomenda que todas as unidades fiquem vinculadas e que a central disponha de uma política de consumo baseada em evidência científica, selecionando apenas os medicamentos mais adequados e evitando multiplicação de alternativas equivalentes.
A gestão de stocks também será otimizada, com controlo centralizado para prevenir desperdícios. António Lobo Ferreira recorda casos em que “um milhão de euros em medicamentos” foram encontrados fora de prazo e defende a necessidade de fracionar embalagens para que o conteúdo possa ser usado em vários doentes, evitando perdas significativas.
O relatório reforça ainda a importância da transformação digital, com integração total dos sistemas informáticos de saúde para que médicos e enfermeiros possam aceder ao processo clínico completo de cada doente, em qualquer nível de cuidados.
A expansão da telemedicina, da hospitalização domiciliária e dos acordos de partilha de risco com fornecedores de medicamentos inovadores são apontadas como formas de reduzir custos e aumentar a eficiência do SNS. As auditorias regulares são igualmente vistas como um pilar essencial para garantir transparência e controlo de resultados.
Planeamento estratégico e valorização dos profissionais
No capítulo dos recursos humanos, o grupo propõe a criação de um Inventário Nacional dos Profissionais de Saúde, abrangendo os setores público, privado e social. A medida, prometida há mais de uma década, permitirá conhecer com precisão as necessidades em termos de especialidades e regiões, para planear formações e contratações de forma estratégica.
O relatório defende ainda a revisão dos modelos de remuneração e carreiras no SNS, tornando-os mais atrativos e baseados na produtividade, complexidade e desempenho. O objetivo é fixar profissionais e reduzir o impacto da escassez de médicos e enfermeiros em várias áreas.