
“Tu não és a Madeleine”: Casal McCann enfrenta em tribunal jovem que diz ser Maddie
Chamadas, cartas, e-mails e até idas à moradia do casal McCann. Estas foram algumas das revelações da sessão desta quarta-feira do julgamento da jovem polaca, Julia Wandelt, que diz ser Madeleine McCann, a menina britânica desaparecida em 2007 num condomínio da Praia da Luz, no Algarve.
A arguida procurou, desde 2022 até fevereiro deste ano, que o casal McCann concordasse em fazer um teste ADN para tirar qualquer dúvida da paternidade.
Com os pais de Maddie a participar na audiência, Julia foi ouvida esta quarta-feira sobre a acusação de stalking (perseguição, em português) no Tribunal da Coroa de Leicester, em Inglaterra, juntamente com a co-arguida Karen Spragg que assediou moralmente a família McCann.
Já segue a Informação da Renascença no WhatsApp? É só clicar aqui
A mãe de Maddie, Kate McCann, prestou depoimento por de trás de uma cortina azul-clara, visivelmente “perturbada”, porque não concorda com as “abordagens persistentes” de Julia para fazer um teste de ADN. O pai, Gerry McCann, defendeu no seu depoimento que esta “perseguição” é mais um atraso na investigação.
“Não é da nossa responsabilidade fazer um teste ADN, é uma questão para as forças de investigação”, indica o pai da menina desaparecida.
“Nada faz sentido.” A mãe McCann disse que basta comparar as fotografias, lado a lado. “Eu sei que não posso dizer como a Madeleine se parece agora, mas eu iria reconhecê-la”, assegurou.
Em julgamento, ouviu-se um áudio de Júlia para Kate: “Se eu for a Maddie, então tudo deve ficar bem, mas se não for, o que provavelmente pensas, então vou deixar-te em paz”.
Mas quem é Julia Wandelt?
A jovem de 24 anos é acusada de invadir a privacidade e liberdade à família McCann desde que criou na rede social Instagram uma conta “@iammadeleinemccann” e assumiu-se como Maddie.
Desde aí, a arguida começou a inscrever-se em vários fóruns e grupos online, contactando inclusive o portal “Find Madeleine” (em português, “Encontrar Madeleine”), de acordo com Kate McCann.
A 24 de junho de 2023, Julia contactou Gerry McCann a partir de um email institucional de um hospital em Leicester alegando ser a sua filha. O pai encaminhou a correspondência, de imediato, para as autoridades.
Em resposta, a policia enviou uma fotografia da arguida. “Esta é a rapariga com quem tivemos contacto e que pensa ser a Madeleine. Estamos bastante confiantes de que não é, mas poderia olhar para a fotografia?”, comentaram as autoridades.
Ligar aos pais de Madeleine passou a ser uma rotina nos últimos três anos.
A última pessoa não-familiar que viu Madeleine, David Payne, cedeu este e os restantes contactos da família. Para a primeira chamada, Julia usou a central telefónica do mesmo hospital para telefonar Gerry McCann.
Mas até a irmã de Maddie, Amelie, atualmente com 20 anos, foi contactada em janeiro de 2024. A mãe alegou só ter descoberto em setembro de 2024. “Foi a gota de água.”
Quando começaram as “perseguições”?
“Muitas vezes o telefone tocava, tocava e tocava sem identificar a chamada. Não me lembro das palavras exatas, mas disse-lhe algo como: ‘tu não és a Madeleine’“, atirou Gerry McCann, na sessão desta quarta-feira.
Nos primeiros meses de 2024, Julia não desistia e enviava também mensagens pelas redes sociais. Em troca, só queria “uma chamada”. Em tribunal, Kate McCann citou algumas de abril do ano passado: “Nunca te menti, não sou louca. Os média fizeram-me parecer louca”, dizia Julia, mas a mãe de Maddie “não queria interagir”.
Insatisfeita com a falta de resposta, a alegada stalker viajou da Polónia até à aldeia natal dos McCann para encontrar a família na vigília de aniversário do desaparecimento da menina. Como os pais não estavam na cidade, Julia abordou o padre da aldeia e a tia-avó de Madeleine.
A 7 de dezembro de 2024, Julia planeou uma nova interação e contou com a companhia de Karen Spragg, de 61 anos, uma “defensora acérrima da teoria da conspiração” de que os pais de Madeleine são responsáveis pelo seu desaparecimento, segundo o procurador do caso, Michael Duck.
A co-arguida Karen foi acompanhar Julia à porta da casa da família McCann em Leicestershire a exigir um teste de ADN e desafiou Kate: “Faça o teste se quiser descobrir.”
“Estacionei na entrada da garagem, estava muito escuro com vendavais muito fortes. Estava a abrir o porta-bagagens para pegar nas minhas coisas e assustei-me quando ouvi: ‘Kate!‘”, recorda a mãe de Maddie.
Gerry McCann apressou-se a gravar áudio enquanto pedia às acusadas para abandonarem o local e Kate sentia-se “obviamente muito angustiada, irritada e com dificuldade em concentrar-se”, confirmou esta quarta-feira em tribunal.
O júri revelou mensagens das arguidas que discutiram a possibilidade de vasculhar os contentores de lixo da moradia.
“Não sou bonita como a Madeleine, mas sei quem sou”
No dia seguinte ao encontro, Julia Wandelt deixou uma carta afixada na porta dos McCann, assinada com o nome “Madeleine” com um beijinho. A missiva foi lida na integra na sessão desta quarta-feira:
“Querida mãe,
Lamento lhe ter causado tanto sofrimento, mas, quando a vi ontem, as minhas emoções foram tão fortes.
Senti uma ligação próxima consigo. Não gosto de a ver chateada.
Tudo o que quero é descobrir a verdade. Tenho memórias e reuni muitas provas que apoiam o meu caso.
Acho que, no fundo do seu coração, acredita e sabe quem eu sou e que sou sua filha.
Não percebo porque é que não quer fazer um teste ADN comigo.
Acho que estás com medo, mas, seja o que for que te assuste, lembra-te que és mais forte do que isso.
Ontem, ouvi muito carinho e amor na sua voz. Espero que encontre uma forma de entrar em contacto comigo.”
Da perseguição, à detenção
Em reação no tribunal à leitura, Kate McCann disse que este foi dos episódios mais “angustiantes” e que denunciou a jovem à polícia um dia depois.
Até a jovem polaca ser detida, a mãe de Madeleine recebia constantemente áudios de Julia a lamentar-se da falta de reconhecimento e a dizer sentir-se deprimida. “Não desistas da tua filha. Sei que o meu sotaque é polaco porque vivo aqui… não sou bonita como a Madeleine, mas sei quem sou, sei e recordo-me.”
Em resposta, a mãe de Madeleine confessou que “o comportamento da Julia indiciava que ela poderia ter problemas de saúde mental”.
Julia acabou por ser detida no aeroporto de Bristol a 19 de fevereiro deste ano enquanto desembarcava de um voo. A outra acusada foi detida posteriormente enquanto aguardava por Julia no parque de estacionamento.
O advogado da família McCann, Russell Flint KC, defendeu que “a polícia poderia ter tomado medidas através de uma ordem de proteção contra a perseguição”.
A próxima sessão do julgamento mediático continua esta quinta-feira.
Source link