
«Cuidar não tem de ser um ato solitário»: novo podcast
Cuidar é um ato de amor. Mas é também, muitas vezes, um caminho solitário, exigente e invisível. Em Portugal, mais de um milhão de pessoas assumem o papel de cuidadores informais, muitos deles vivendo o chamado efeito sanduíche — divididos entre cuidar dos filhos, de pais envelhecidos e de familiares em situação de dependência.
O primeiro episódio do podcast ‘Conversas que Cuidam’, uma parceria Fidelidade e Líder, lança luz sobre esta realidade, reunindo duas especialistas: Ângela Santos Romão, psicóloga social e investigadora, e Bruna Fernandes, enfermeira com experiência em cuidados continuados.
Este novo podcast promete conversas para parar, refletir e sentir. Ao longo de oito episódios, os convidados vão trazer histórias, insights e dicas sobre bem-estar, saúde e equilíbrio, dentro e fora do trabalho.
Conduzido por Rita Figueiredo, psicóloga e gestora de pessoas, e Soraia Jamal, psicóloga e psicoterapeuta, estas ‘Conversas que Cuidam’ vão combinar perspetivas individuais e organizacionais para promover resiliência, inclusão e qualidade de vida.
Cuidar começa de forma inesperada e, por vezes, nunca termina
Para Ângela Romão, ser cuidador informal é «prestar cuidados, geralmente não remunerados, a alguém em situação de dependência», seja por doença crónica, deficiência ou envelhecimento. As tarefas vão desde o apoio à alimentação e higiene até à gestão de medicação e acompanhamento emocional.
«Muitos cuidadores tornam-se médicos, enfermeiros e assistentes sociais ao mesmo tempo, sem formação para isso», sublinha. É um percurso vivido em silêncio.
Os dados mostram um perfil predominante: mulheres de meia idade, com baixa escolaridade e rendimentos reduzidos, frequentemente a tentar conciliar o cuidado com um emprego. Contudo, há também homens cuidadores, sobretudo mais velhos, e jovens que assumem responsabilidades parentais. É uma realidade democrática, que pode tocar a qualquer um.
Na perspetiva de Bruna Fernandes, a sociedade portuguesa é mesmo «educada para cuidar desde cedo». Cuidar dos irmãos, dos filhos, dos pais — «faz parte da nossa educação e sentido de responsabilidade». Mas, adverte, «é essencial reconhecer os próprios limites» e aceitar que não é possível fazer tudo.
O impacto emocional de quem cuida é imenso
O peso emocional é elevado: 46% dos cuidadores afirmam sentir-se frequentemente nervosos e 84% vivem em exaustão emocional, segundo estudos citados por Ângela. A imprevisibilidade e o confronto diário com o sofrimento alheio geram ansiedade, burnout e isolamento.
«Cuidar exige presença constante e raramente há tempo para descanso», explica a investigadora. Daí a importância de autocuidado: «Cuidar de si não é egoísmo, é uma necessidade. Sem cuidarmos de nós, não conseguimos cuidar dos outros».
Entre as estratégias, destaca a promoção da autonomia da pessoa cuidada, a prática de atividades de lazer e o pedido de ajuda. Mas reconhece que «os cuidadores têm dificuldade em pedir e, sobretudo, em aceitar ajuda.»
Para Bruna Fernandes, a antecipação é fundamental: «Devemos falar cedo sobre o que queremos e podemos fazer, prevenir a sobrecarga e planear os apoios necessários». A comunicação aberta com familiares, profissionais e até vizinhos é a base de um cuidado sustentável, de forma a criar um equilíbrio assente na realidade.
O papel das organizações: entre empatia e ação
A conciliação entre o cuidado informal e a vida profissional é um fator protetor do bem-estar, destaca Ângela Romão. Por isso, as empresas – e os líderes – têm um papel crucial: oferecer flexibilidade de horários, teletrabalho, formação e apoio psicológico.
Por vezes, a simples disponibilidade de colegas e equipa, mostrar curiosidade sobre a situação, quebrar estigmas, podem ser tentativas informais de inclusão. «A inclusão dos cuidadores é uma questão de sustentabilidade organizacional», reforça a psicóloga.
A Fidelidade foi pioneira ao criar o ‘Programa Nós’, com medidas específicas para colaboradores cuidadores. Um exemplo de como o reconhecimento institucional pode aliviar a carga e fomentar a dignificação de quem cuida.
A conclusão é simples: «Os cuidadores são heróis, mas também precisam de cuidado.» Pedir ajuda, partilhar responsabilidades e estar em comunidade são atos de coragem e é crucial que todos comecemos a olhar atentamente para quem cuida, ao nosso redor. Porque, como conclui Bruna Fernandes, «cuidar não é um fardo — é presença, escuta e afeto».