
“Os atuais autarcas fazem de si deuses”. Francelina Chambel, uma das primeiras mulheres presidentes de Câmara
Pedimos para Francelina Chambel se apresentar, explicar quem é, o que faz e o que fez. Com um sorriso na cara, responde: “É um bocado complicado, porque a vida já é um bocado comprida, não é?“.
Tomara a todos chegar aos 91 anos como os 91 anos chegaram a Francelina Chambel. Ao dia de hoje, os problemas de saúde obrigaram-na a sair do Sardoal – para onde volta sempre que pode -, mas a idade não tira o espírito crítico em relação à sociedade.
Sentada no sofá de sua casa, agora em Cascais, recebe a Renascença com a satisfação – mas sem “vaidade” – de quem deu o que tinha nos 17 anos enquanto presidente da Câmara do Sardoal, entre 1976 e 1993. Parece um percurso normal, mas foi pioneira. Uma das “cinco magníficas”, as cinco mulheres a serem eleitas presidente de Câmara nas primeiras autárquicas em democracia e quebrar uma barreira num país recém-saído de uma ditadura.
Na altura, não conhecia a fundo o concelho ribatejano. Nasceu mais acima, em Miranda do Corvo, distrito de Coimbra, e foi através do marido que conheceu o Sardoal. O país vivia em agitação política e preparava-se para as primeiras eleições autárquicas da sua ainda verde democracia.
Eleita inesperadamente
O Sardoal era a terra do marido, iam lá com “muita frequência”, mas só “de visita”. Surgiu um convite do PS que a deixou “perplexa“, candidatou-se sem qualquer expectativa: “Aceitei o convite na esperança de que aquilo não fosse viável, não é?”.
“Fomos fazer campanha no escuro e resultou. Alguma vez as pessoas me elegiam? Acabou por acontecer”, conta, bem disposta. A vida trocou-lhe as voltas, saiu de Marvila, em Lisboa, onde estava a chefiar uma secção da segurança social, e lá foi para o Sardoal. O resto é história, fez cinco mandatos no concelho.
Na altura não era militante socialista. Mas isso mudou por força de um homem: “Só fui militante passados oito anos, com grandes insistências do Mário Soares, que me apanhou lá no Sardoal numa celebração e disse ‘agora assinas aqui o teu nome’, e eu lá assinei”.
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