
Aumentaram pedidos de apoio à APAV por violência sobre pessoas idosas
Está à vista um novo recorde de pedidos de apoio por violência sobre pessoas acima de 65 anos. Nos primeiros oito meses do ano, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) registou quase tantas denúncias de violência sobre idosos como em todo o ano de 2024.
Os dados da APAV foram revelados à Renascença nesta quarta-feira, 1 de outubro, o Dia Internacional da Pessoa Idosa.
Um total de 1557 pessoas acima de 65 anos foram ajudadas pela APAV entre janeiro a agosto deste ano. São mais de 190 denúncias por mês. O recorde de 1730 pessoas apoiadas pela APAV no ano passado – correspondente a mais de 144 denúncias mensais – está prestes a ser ultrapassado.
“Temos notado esta tendência de ligeiro aumento dos pedidos de apoio, o que não significa necessariamente um aumento do crime. Pode significar, como reforçamos muitas vezes, um maior conhecimento das pessoas dos serviços que disponibilizamos, uma maior sensibilização de pessoas à volta das vítimas e que queiram ajudar aquela pessoa que está na situação de vitimação”, explica Marta Carmo, coordenadora do projeto “Portugal Mais Velho”, da APAV.
O projeto vai ser objeto de reflexão esta terça-feira num seminário na Fundação Gulbenkian em Lisboa.
Retrato das denúncias
Denunciar à APAV não significa denunciar às autoridades. Por isso, os casos que chegam à associação são categorizados como ” pedidos de apoio”.
“A denúncia ou queixa é o início do processo penal ou criminal e é feito às autoridades, às forças de segurança pública. À APAV, as pessoas fazem pedidos para receberem algum apoio, independentemente da apresentação de queixa ou de denúncia, sendo certo que, muitas vezes, após pedirem-nos apoio, a informação que prestamos e o apoio que damos vai no sentido das pessoas depois fazerem a denúncia, se assim quiserem, às autoridades, para poderem a proteção jurídica e as medidas de segurança que possam ser aplicadas no seu caso”, explica Marta Carmo.
Em média, cada pessoa idosa apoiada foi alvo de dois crimes, o que eleva o número destes crimes este ano para 2861 até Agosto. Outros números: 81% das vítimas idosas que chegaram à APAV foram sujeitas a violência doméstica e 75% destas vítimas são mulheres. A maioria dos agressores denunciados são filhos (33,5%) ou cônjuges (22,8%).
A APAV apoiou pessoas idosas oriundas de 175 municipios dos 308 existentes em Portugal. 20,9% estão no distrito de Lisboa, seguindo-se as vítimas nos distritos de Braga (16,1%), Faro (13,6%) e Porto (12%). Uma vítima pode ter sido violentada em mais do que um local em simultâneo, sendo que os mais identificados são a residência comum (53,9%) e da vítima (28,1%)
” É natural que tenhamos uma maior percentagem de pessoas idosas apoiadas que correspondem, de certa forma, aos distritos onde existem serviços físicos da APAV. Temos uma atuação a nível nacional, com 85 serviços de proximidade diferentes por todo o território, incluindo na região autónoma dos Açores. Mas a verdade é que ainda não temos serviços que cubram todos os distritos”, explica Marta Carmo.
Cifras negras
Apesar do aumento das denúncias à APAV, o panorama pode ser ainda mais grave. Marta Carmo diz que há menos casos reportados do que a realidade da violência sobre idosos.
“O que é consensual – até mesmo as próprias forças de segurança muitas vezes abordam este tema – são as cifras negras. São os casos que nunca chegam a ser conhecidos. E sentimos que, com a população mais velha, parece-nos que essas cifras negras aumentam proporcionalmente”, explica a responsável da APAV.
Quem está no terreno reconhece que ainda há muito trabalho por fazer neste domínio. “Há ainda uma certa normalização da violência contra pessoas idosas e, portanto, um menor número de denúncias e uma maior ocultação do fenómeno”, afirma Marta Carmo.
Mais capacitação dos idosos
A APAV e a Fundação Gulbenkian juntam-se esta quarta-feira num seminário que analisa esta realidade neste Dia Internacional da Pessoa Idosa. Entre as lições do projeto Portugal Mais Velho está a necessidade de capacitação das próprias pessoas idosas.
“É de facto algo em que acreditamos piamente. As próprias pessoas idosas são um fator muito importante na prevenção e na denúncia desta violência e não devem ser esquecida. Estamos a falar sobre elas, sobre as dinâmicas e os contextos de violência que as afetam. E portanto elas próprias devem ser agentes nesta prevenção e é para isso que esperamos também poder contribuir com o projeto”, remata Marta Carmo, coordenadora deste projeto que nasceu em janeiro de 2019, fruto da parceria entre a APAV e a Fundação Calouste Gulbenkian.
O projeto passou por uma auscultação alargada de 81 profissionais de diferentes áreas – justiça, saúde, ação social, comunicação social, entre outras – e de 38 pessoas idosas, com idades entre os 65 e os 95 anos. Redundou no Relatório Portugal Mais Velho, para um retrato atualizado sobre a violência contra pessoas idosas em Portugal, incorporando diferentes temáticas e analisando a legislação, políticas públicas e boas práticas existentes. O documento, datado de Outubro de 2020, continha 30 recomendações concretas dirigidas ao Estado, às instituições sociais, à comunidade e à sociedade em geral, para prevenir a violência e promover os direitos das pessoas idosas.
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