Atualidade

Estados Unidos usam ‘smartwatch’ inamovível para rastrear imigrantes: dispositivo tem causado complicações médicas a grávidas

Publicidade - continue a ler a seguir

Chegava a um hospital no estado norte-americano do Colorado para dar à luz. No pulso, trazia um smartwatch (relógio inteligente), que apitava por falta de bateria. Mas este não é um relógio qualquer e esta mulher, nascida na Ásia Central e imigrante nos Estados Unidos (EUA), sabia-o perfeitamente. Não era suposto que a bateria chegasse ao fim.

O caso, reportado pelo “The Guardian”, remonta ao início de setembro e o relógio que esta mulher usava não se tratava de um dispositivo desportivo de contagem de passos e calorias ou de monitorização do ritmo cardíaco. As funcionalidades são outras.

Desenvolvido pela BI Incorporated (BI Inc.), uma empresa tecnológica que desenvolve serviços de monitorização eletrónica para agências governamentais, o relógio chama-se VeriWatch e teria sido colocado no pulso desta mulher pelo ICE – o Serviço de Imigração e Alfândega norte-americano, que ordenou que o dispositivo fosse usado permanentemente, à semelhança de uma pulseira eletrónica.

Segundo os médicos que a atenderam, consultados pelo jornal britânico, dias antes de chegar àquele hospital, a mulher, que permaneceu não identificada de modo a não sofrer eventuais retaliações, teria estado num voo de deportação para o México, mas o piloto ter-se-ia recusado a embarcá-la, devido ao elevado tempo de gestação que apresentava.

À medida que o momento do parto se ia aproximando, o medo desta mãe era também crescente. “Se a bateria acabasse, os agentes poderiam pensar que ela estava a tentar desaparecer”, referiram os médicos.

O processo não estava a correr de acordo com o esperado e a equipa médica considerou necessário proceder a uma cesariana, um procedimento que requer que acessórios e metais sejam removidos de modo a garantir a segurança do paciente, visto que a interferência destes elementos com o instrumento de cauterização utilizado durante a cirurgia pode provocar queimaduras ou choques elétricos.

Estava tudo pronto para a cirurgia. No entanto, não havia forma de remover o relógio, nem de contactar o ICE. Quando os médicos lhe disseram que teriam de cortar o relógio, o medo aumentou e deu lugar ao pânico.

“Ela tinha tanto medo de que [o ICE] lhe viesse retirar o bebé”

Este é um dos vários casos de pessoas que utilizam o VeriWatch como parte do programa Alternativa à Detenção (ATD, na sigla em inglês), uma operação governamental na qual participam atualmente cerca de 200 mil pessoas, que permite que imigrantes selecionados pelo ICE aguardem pelo julgamento em liberdade, desde que sujeitos a monitorização permanente.

Entre os métodos de supervisão estão, além dos relógios, as tradicionais pulseiras eletrónicas e uma aplicação de reconhecimento facial, também da BI Inc. Duas outras mulheres que chegaram ao mesmo hospital com o relógio mostraram-se igualmente relutantes em retirá-los, ainda que por necessidade médica.

Uma delas apresentava pré-eclampsia, uma complicação na gravidez relacionada com a pressão arterial elevada, que causa grandes inchaços. Com a equipa preocupada que a bracelete apertada do relógio num pulso inchado pudesse causar um corte na circulação, a mulher só conseguia chorar, segundo relata o “The Guardian”, com medo de ser abordada pelo ICE ainda no hospital e de ficar sem o filho para os serviços de imigração.

“Esperar e tentar perceber estas coisas, mesmo quando o caso não é super urgente, pode levar a que algo de urgente aconteça”, diz um dos médicos ao mesmo jornal, denunciando os atrasos causados pelo aparelho e salientando que, no caso das pulseiras eletrónicas, existe um protocolo entre o hospital e o departamento penitenciário estatal para que possam ser imediatamente removidas em caso de necessidade. “Às vezes, fazer uma cesariana 20 minutos antes de acontecer alguma coisa de mal pode prevenir que essa coisa aconteça”.

Medo da deportação impede imigrantes de procurar cuidados médicos adequados

Os serviços médicos dos Estados Unidos têm revelado os impactos das medidas de imigração promovidas pela administração Trump no quotidiano dos pacientes, apontando que muitas delas têm vindo a promover um medo crescente dos imigrantes na procura por ajuda médica. “Obviamente isto tem um efeito em cadeia”, diz a presidente da Associação de Enfermagem da Califórnia, citada pelo “Guardian”. “Se não virem um médico com regularidade, as consequências vão ser piores e vai ser preciso esperar até terem uma crise para irem à emergência”.

Dados da organização “CommunityHealth” documentam ainda uma descida em 30% no número de pacientes a aparecer nas consultas e em 40% nos pacientes a recolherem a sua medicação desde que Trump voltou a assumir a presidência norte-americana.

Além das gestantes, também um imigrante do Bangladesh nos EUA foi obrigado a ser sujeito a supervisão pelo ICE através de uma pulseira eletrónica, enquanto aguardava julgamento. Com uma declaração médica enviada pelo advogado à BI Inc., que apelava à empresa e aos serviços de imigração para que a pulseira fosse removida devido a um problema nos nervos da perna em que tinha sido instalada, a empresa, que nunca chegou a responder ao advogado, indicou ao imigrante, num check-in presencial, que o dispositivo poderia ser transferido para a outra perna.

No entanto, depois de o advogado comunicar a situação ao ICE, para que o serviço pudesse transferir a pulseira, os agentes detiveram e prenderam o homem. “Ele explicou que estava apenas a pedir para mudar a pulseira de perna, e o agente disse que era ‘demasiado tarde’”, consta numa petição citada pelo jornal.

Em setembro foi celebrado um novo contrato de dois anos entre o ICE e a BI Inc., pelo que a administração Trump se mostrou satisfeita com a priorização por parte da empresa das pulseiras eletrónicas (mais caras) nos imigrantes que já estão no programa ATD, em vez de dispositivos mais económicos, como a aplicação de reconhecimento facial.

Texto escrito por André Sousa e editado por Pedro Miguel Coelho

Fonte: Lifestyle Sapo

Publicidade - continue a ler a seguir

Seja membro da PortalEnf 




[easy-profiles template="roundcolor" align="center" nospace="no" cta="no" cta_vertical="no" cta_number="no" profiles_all_networks="no"]

Portalenf Comunidade de Saúde

A PortalEnf é um Portal de Saúde on-line que tem por objectivo divulgar tutoriais e notícias sobre a Saúde e a Enfermagem de forma a promover o conhecimento entre os seus membros.

Artigos Relacionados

Deixe um comentário

Publicidade - continue a ler a seguir
Botão Voltar ao Topo