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Abemaciclib na adjuvância do cancro da mama

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A sessão contou com a moderação de José Luís Passos Coelho, presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia e médico oncologista do Hospital da Luz Lisboa, e de Luís Costa, da ULS Santa Maria, e teve como principais intervenientes Miguel Abreu, médico oncologista no IPO do Porto, e Nuno Tavares, médico oncologista na ULS São João.

Sete anos de follow-up e um benefício que se mantém
Coube a Miguel Abreu abrir a sessão com a apresentação dos dados mais recentes do ensaio MonarchE, um estudo clínico de fase III que avaliou a eficácia do abemaciclib, comercializado como Verzenios, em associação com terapêutica endócrina, em doentes com cancro da mama inicial de alto risco, RH positivo e HER2-negativo.

“Vou apresentar os últimos dados do follow-up a sete anos do abemaciclib, em contexto adjuvante, em carcinoma da mama. O MonarchE acabou por alterar aquilo que é o nosso tratamento adjuvante, introduzindo aqui um benefício de um novo fármaco à terapêutica, quer endócrina, quer standard”, começou por afirmar Miguel Abreu, enquadrando desde logo o impacto do estudo na prática clínica quotidiana.

O oncologista recordou que o ensaio se centrou, em particular, nas doentes incluídas na coorte 1 e na coorte 2, caracterizadas por critérios de elevado risco de recorrência. “Estamos a falar de doentes com mais de quatro gânglios metastizados, ou com um a três gânglios, mas com pelo menos uma característica adicional de alto risco”, explicou, sublinhando que estes critérios passaram a integrar a decisão terapêutica de forma rotineira.

À medida que o follow-up foi sendo prolongado, os resultados mantiveram-se consistentes. “Logo nos primeiros resultados percebemos que os endpoints primários, nomeadamente a sobrevivência livre de doença invasiva e a sobrevivência livre de doença à distância, eram positivos”, recordou. A dúvida inicial residia na possibilidade de um eventual carry-over effect perder força com o tempo. “Os dados aos 54 meses mostraram que o benefício era sustentado e, agora, com o follow-up a sete anos, isso confirma-se de forma clara”.

Os números apresentados reforçam essa leitura. Segundo Miguel Abreu, o ensaio demonstra “reduções de risco de 27,4% na sobrevivência livre de doença invasiva e de 25,4% na sobrevivência livre de doença à distância”, com um benefício que surge de forma precoce, logo no primeiro ano de tratamento, e que se mantém ao longo do tempo, à medida que as curvas se afastam.

Pela primeira vez, o estudo apresenta também dados maduros de sobrevivência global. “O estudo é positivo. Temos uma redução do risco de morte de 16,5% numa população de muito alto risco”, afirmou, destacando o rigor metodológico exigido pelas autoridades regulatórias, que implicou um número elevado de eventos antes da análise final. “Estamos a falar de um ensaio de fase III, multicêntrico, mundial, e isso também é importante sublinhar”.

 Segurança, ajustes de dose e prática clínica
Outro dos pontos centrais da apresentação de Miguel Abreu foi o perfil de segurança do abemaciclib. “Com os follow-ups mais prolongados, percebemos que os padrões de segurança se mantêm exatamente iguais”, afirmou, acrescentando que a maioria dos eventos adversos surge nos primeiros meses de tratamento.

Apesar de cerca de 43,4% das doentes necessitarem de reduções de dose, essa necessidade não se traduziu numa perda de eficácia. “Já sabemos, com dados publicados do MonarchE e também com dados de vida real dos Estados Unidos, que esses ajustes não diminuem o benefício do tratamento, e isso é algo muito importante para a prática clínica”, sublinhou.

Miguel Abreu alertou ainda para a perceção, por vezes generalizada, de que a doença luminal recidiva mais tarde e tem um prognóstico mais favorável. “Quando olhamos para esta população de muito alto risco, percebemos que, aos sete anos, cerca de 11% das doentes tratadas apenas com terapêutica standard já morreram. Isto deve sensibilizar-nos para a agressividade desta doença em determinados subgrupos”.

Na discussão subsequente, questionado pela moderação sobre a necessidade frequente de ajustes de dose na prática clínica, o oncologista foi claro: “Num centro de alto volume, como é o meu, temos de tudo. Doentes que toleram muito bem, outras em que é preciso reduzir a dose. A preocupação é garantir adesão, sobretudo em doentes que já passaram por quimioterapia, cirurgia e radioterapia. Se queremos que adiram durante dois anos, temos de explicar bem os benefícios e gerir os efeitos secundários de forma pragmática”.

O puzzle terapêutico e a visão global
A segunda palestra do simpósio ficou a cargo de Nuno Tavares, sob o tema “O contributo de Verzenios para uma revolução terapêutica: estamos prontos?”. O oncologista da ULS São João propôs-se dar uma visão panorâmica sobre o papel do abemaciclib ao longo de todo o espectro da doença luminal, do estádio precoce ao metastático.

“Foi-me pedido que encaixasse as peças de um puzzle que os ensaios MonarchE foram construindo ao longo dos últimos anos”, afirmou, começando pelos dados pré-clínicos que distinguem o abemaciclib de outros inibidores das ciclinas. Entre as características destacadas estão a maior seletividade para a CDK4, a capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica e o regime de administração contínua. “Esta inibição contínua pode traduzir-se numa maior eficácia ao nível do controlo do ciclo celular e da indução de senescência e apoptose”, explicou.

Seguiu-se a análise do programa clínico MonarchE, que, segundo Nuno Tavares, “cobre todo o espectro da doença luminal, tanto precoce como metastática”. No contexto adjuvante, salientou que se trata do único ensaio com inibidores das ciclinas que recrutou doentes em Portugal após o início da terapêutica endócrina. Já em situação de doença metastática, o fármaco demonstrou benefício tanto em doentes sensíveis como resistentes à hormonoterapia.

Os dados de eficácia foram apresentados de forma detalhada. “Temos um benefício claro na sobrevivência livre de progressão e na sobrevivência global”, afirmou, referindo medianas de sobrevivência livre de progressão de 29 meses no MonarchE 3 e de 16,9 meses no MonarchE 2. Em termos de sobrevivência global, destacou valores de 66 meses com abemaciclib associado a inibidores da aromatase e de 46 meses em associação com fulvestrant.

Qualidade de vida e trabalho em equipa
A segurança e a qualidade de vida voltaram a surgir como peças fundamentais do puzzle terapêutico. “Os dados mais prolongados não mostram sinais de alarme novos”, garantiu Nuno Tavares, sublinhando que a diarreia, embora frequente, é maioritariamente de baixo grau, manejável e reversível. “As taxas de descontinuação por diarreia são residuais, na ordem dos 2 a 4%”.

O oncologista enfatizou ainda a importância do acompanhamento multidisciplinar, antecipando os testemunhos de Armandina Esteves, responsável pela consulta farmacêutica oncológica da ULS São João, e de Anabela Amarelo, enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação na ULS – Gaia/Espinho.

“Na consulta farmacêutica, o principal objetivo é apoiar o doente para que consiga aderir ao tratamento de forma segura, informada e confiante”, explicou Armandina Esteves, detalhando um acompanhamento que inclui reconciliação terapêutica, educação para a saúde, monitorização precoce de efeitos adversos e apoio contínuo, presencial e à distância. “O farmacêutico, integrado na equipa multidisciplinar, é um elemento-chave para maximizar a probabilidade de o doente beneficiar dos ganhos de eficácia agora demonstrados”.

Já Anabela Amarelo sublinhou que a adesão à terapêutica oral começa na relação. “Na consulta de enfermagem começamos por perceber quem é a pessoa, o que sabe, o que a preocupa e quais são as suas expectativas”, afirmou. “A adesão nasce dessa relação e, quando a pessoa se sente segura, compreendida e acompanhada, consegue gerir melhor o tratamento e reportar mais cedo os sintomas”.

Um novo paradigma em consolidação
No encerramento da sessão, Nuno Tavares sintetizou o impacto global do abemaciclib na prática oncológica. “Temos eficácia comprovada em ensaios de fase III, múltiplas combinações possíveis com terapêutica endócrina, um perfil de segurança estabelecido e a possibilidade de reduzir doses sem comprometer a eficácia”, resumiu, recordando que o fármaco está disponível em Portugal para doença metastática desde 2019 e para doença precoce desde 2024.

Com mais de 270 mil doentes tratados em todo o mundo até 2024 e uma estimativa de 350 mil em 2025, o oncologista concluiu que “estas são as peças do puzzle que mostram o impacto no paradigma terapêutico. A evidência está construída. A pergunta que se coloca agora é se estamos, de facto, prontos para esta revolução”.

 

SO

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Fonte: Saúde Online

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