
A Greve de 11 de Dezembro Não é Uma Greve — É Um Aviso
Chegamos ao dia 11 de dezembro com uma greve geral que não é apenas mais uma. É uma greve que existe para salvar o que resta do direito à greve. E quando um país precisa de parar para defender um direito constitucional básico, é porque já passou demasiado tempo a normalizar o inaceitável.
A Ministra do Trabalho classificou a paralisação como “inoportuna”. Mas há uma pergunta que permanece sem resposta: quando é que uma greve seria “oportuna” para quem está no poder? Nunca. Porque toda a greve é incómoda. Toda a greve é um aviso. Toda a greve é uma forma legítima de dizer basta quando ninguém quer ouvir.
E é precisamente por isso que esta greve acontece. O pacote laboral para 2025 representa um recuo histórico nos direitos de quem trabalha. Não é detalhe, não é ajuste técnico, não é modernização. É uma mudança de rumo.
O aumento dos contratos a termo certo para três anos e dos contratos a termo incerto para cinco anos empurra milhares de trabalhadores para a precariedade permanente. A redução das garantias do teletrabalho quebra proteções essenciais num país onde a saúde mental já é frágil. E a limitação do exercício conjunto dos direitos parentais retira condições familiares básicas a quem tenta equilibrar trabalho e vida pessoal.
O que se prepara é um modelo laboral onde o trabalhador tem menos voz, menos segurança, menos proteção e menos capacidade de contestação. Um país onde “flexibilidade” significa fragilidade. Onde “modernização” significa perda de direitos. Onde “responsabilidade” significa silêncio.
E, como nos lembra a história laboral europeia, nenhum país enriqueceu à custa da resignação dos seus trabalhadores, mas muitos empobreceram por terem acreditado que a economia se fortalece destruindo quem a sustenta.
Entretanto, procura-se construir a narrativa de que a greve coloca setores vitais em risco. Isso não corresponde à realidade. Em Portugal, os serviços mínimos sempre foram cumpridos na saúde, na energia, na segurança, na proteção civil. Mesmo na tão discutida greve cirúrgica dos enfermeiros, houve equipas mínimas asseguradas. Sempre houve. E continuarão a existir.
Aliás, muitos dos serviços que se pretende proteger “da greve” já estão em rutura antes dela: falta de profissionais, carreiras paradas, salários incapazes de competir com o privado e uma cultura laboral exausta.
O problema não é quem pára um dia.
O problema é quem trabalha há anos sem condições para continuar.
E há ainda uma contradição que não pode passar despercebida: o mesmo Estado que critica a greve porque “afeta o país” é aquele que, dia após dia, permite que o país funcione assente em trabalhadores esgotados, mal pagos e descartáveis. A verdadeira irresponsabilidade não está em parar um dia — está em insistir que tudo continue como está.
Por isso é que a greve de 11 de dezembro é essencial. Não é apenas um protesto contra propostas legislativas. É um travão. Um alerta. Uma afirmação coletiva de que a democracia não se esvazia devagar, sem barulho, enquanto todos fingem que está tudo em ordem.
É também um lembrete histórico: cada direito laboral que hoje consideramos óbvio — férias, descanso semanal, limites de horário, proteção na maternidade — nasceu de uma greve que, no seu tempo, também foi considerada “inoportuna”.
Esta greve diz algo muito simples:
- se tirarem aos trabalhadores a capacidade de lutar, tiram-lhes tudo.
E é por isso que este dia é maior do que os seus motivos imediatos. Porque quando um governo demonstra medo de uma greve, é porque sabe que cruzou uma linha. E quando os trabalhadores percebem isso, têm não só o direito mas o dever de parar.
A 11 de dezembro, o país não pára por capricho. Pára para lembrar que sem o direito de lutar, deixa de existir o direito de trabalhar com dignidade.
E isso, sim, seria verdadeiramente “inoportuno” para a democracia.






