Entre Contrações e Conexões: possibilidades da Realidade Virtual Imersiva na promoção do parto normal

Alexandra Tereso

Professora Coordenadora Escola Superior de Enfermagem de Lisboa

Investigadora do Centro de Investigação, Inovação e Desenvolvimento em Enfermagem (CIDNUR)

O parto é, simultaneamente, um acontecimento fisiológico e uma experiência profundamente simbólica e emocional. O processo biológico que o sustenta desenrola-se sob a influência de fatores emocionais e psicológicos que podem interferir de forma decisiva na sua evolução. Sensações e sentimentos como o medo, a dor e o stress, ao influenciarem a libertação de ocitocina, constituem-se como potenciais ameaças à concretização da expectativa de um parto normal.

As estratégias não farmacológicas e os seus contributos para a gestão da dor e do stress, bem como para a satisfação das parturientes, têm sido destacados por várias entidades nacionais e internacionais, entre elas a Organização Mundial de Saúde. Inserida nesse conjunto de estratégias, a imersão em ambientes virtuais 3D cuidadosamente projetados — que podem incluir paisagens naturais ou relaxamento guiado — possibilita o envolvimento da parturiente em vivências sensoriais e emocionais significativas.

A utilização da Realidade Virtual Imersiva (RVI) como recurso implica que a parturiente utilize como dispositivos tecnológicos headset de realidade virtual, headphones e, opcionalmente, controladores manuais, que permitem interação com o ambiente virtual, embora sejam raramente utilizados durante o trabalho de parto. Integrando elementos audiovisuais e a narrativa sensorial, os conteúdos terapêuticos podem ser muito variados.

A tecnologia capaz de criar ambientes tridimensionais interativos tem evoluído de forma notável e a RVI ultrapassou o domínio do entretenimento, alcançando áreas como a reabilitação, a psicoterapia e a gestão da dor. No contexto obstétrico, a utilização da RVI tem despertado crescente interesse, em virtude dos efeitos positivos observados na experiência de parto das mulheres. Diversos estudos, conduzidos em diferentes países e com distintas metodologias de investigação, destacam a promoção da distração cognitiva e do relaxamento como contributos relevantes da RVI.

Em mulheres sem contraindicações para o seu uso — como epilepsia ou síndromes vertiginosas — a RVI pode constituir uma alternativa eficaz na redução da perceção da dor e na promoção do relaxamento, favorecendo a progressão fisiológica do trabalho de parto.

Do ponto de vista da enfermagem especializada em saúde materna e obstétrica, a introdução da RVI representa uma nova dimensão do cuidado humanizado. A oportunidade de oferecer uma estratégia inovadora e sustentável, de forma ética e personalizada, respeitando as necessidades e preferências de cada mulher, configura-se como uma mais-valia para a humanização dos cuidados, a promoção do parto normal e a satisfação materna.

Contudo, é fundamental considerar os desafios e os limites éticos na sua implementação. A RVI não substitui o toque, o olhar ou a presença — elementos essenciais do cuidado humano. A sua utilização deve ser entendida como uma alternativa complementar e não como substituto do contacto interpessoal. Pressupostos como a segurança, a privacidade e o consentimento informado têm de ser garantidos

Em síntese, entre contrações e conexões, a RVI representa uma oportunidade promissora, sustentada pela evidência científica, que alia sustentabilidade, inovação e a promoção dos direitos das mulheres durante o parto. Mais do que uma inovação tecnológica, a RVI simboliza um novo olhar sobre o nascimento — um olhar que integra o fisiológico e o digital, o corpo e a mente, o físico e o emocional, a conexão e o empoderamento.