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Os miúdos não estão OK. Violência está a aumentar entre jovens e anda de mão dada com o telemóvel

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Quando o telemóvel é um agente (des)educativo

Os telemóveis deveriam ser tratados como cigarros e proibidos até aos 16 anos. A ideia é de Jack Thorne, argumentista de “Adolescência”, a série que explora os motivos que levaram um adolescente de 13 anos a assassinar uma colega. “Spoiler alert”: os conteúdos que via no “smartphone” tiveram um papel decisivo na conclusão da história.

Por cá, o cronista Daniel Oliveira já fez uma comparação semelhante: “Um dia olharemos para uma criança com um ‘smartphone’ como se estivesse a fumar”, escreveu no Expresso.

Para a psicóloga Raquel Raimundo, um telefone nas mãos de uma criança ou adolescente tem de coexistir com supervisão parental. A violência que lhes passa pelos dedos tem de ser filtrada, e posta em contexto, pelos pais, para evitar a dessensibilização. Mas com jovens entregues cada vez mais a si mesmos, muitas vezes porque os horários de trabalho dos pais não permitem que seja de outra forma, o telemóvel tornou-se no principal agente educativo de uma geração. Só que não educa.

Por isso, já não importa apenas se há violência dentro da família. Importa também saber que violência encontram as crianças nos ecrãs, diz Raquel Raimundo, psicóloga.

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“Antes estavam muito dependentes, sobretudo, do quê? Se existia ou não violência na própria família e se havia modelos primários de violência, ou pouca supervisão parental também. Estavam dependentes do bairro, da comunidade onde estavam inseridos”, defende.

Só que hoje há “miúdos que passam mais horas online do que com a família” ou do que na escola. “Justamente por isso está ali outro agente educativo que antes não existia. E neste momento, em algumas crianças e adolescentes, é o principal agente educativo. Isso é preocupante.”

Pais e escolas, uma relação difícil

Ninguém nega que há agressividade entre os jovens, mas não é unânime dizer que ela aumentou. E se os pais de Rita, Filipe e Gustavo se queixam de falta de resposta das escolas, entre os diretores há a ideia de que o conflito e a falta de diálogo com os encarregados de educação está a piorar.

Falando pelos colégios, Rodrigo Queiroz e Melo, da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), diz não sentir que as escolas privadas estejam mais violentas. Em contrapartida, nota que é dada mais atenção à violência entre os jovens e àquela que está associada ao mundo digital. “Acaba por haver novas formas de se ser vítima e agressor no mundo digital. E jovens que não tinham tanta propensão para a violência, por ser uma coisa muito visível, sentem-se mais empoderados para serem agressores no segredo do mundo digital.”

Na escola pública, tal como na sociedade, Filinto Lima diz que após a pandemia estão todos menos pacientes. “Em vez de conversar, parte-se para o impropério, para a agressão”, diz o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Para dar conta do problema, gostava de ter mais recursos humanos: psicólogos, assistentes operacionais, assistentes sociais e até mediadores de conflitos.

No Agrupamento de Escolas Padre Bartolomeu Gusmão, em Campo de Ourique, o diretor Jorge Nascimento acredita que não há mais agressões, mas sente que a intensidade dos conflitos mudou.

“Antes os miúdos resolviam mais as coisas, um empurrão para a esquerda e uma chapada para a direita, e o assunto ficava resolvido. Hoje, a agressão que existe deixa mais marcas, é mais dolorosa, porque ficam marcas que não são físicas.” O diretor vê também maior perversidade nos atos dos jovens: “Socorrem-se da panóplia de tecnologias que têm ao dispor e há muita agressividade.”

Os pais nem sempre ajudam. ”Muitas vezes, não sei porquê, culpam as escolas de tudo e de nada. Era importante que os pais percebessem a missão das escolas. Não há nenhuma escola que esteja contra um aluno, que esteja contra um pai”, defende Filinto Lima.

Além disso, a autoridade dos adultos já não é o que era. “Há uma perda de autoridade dos pais, que muitas vezes são enganados pelos filhos, embora jurem a pés juntos, quando vêm falar com os diretores, que o filho não mente. Os pais confiam de uma forma infinita nos filhos, e desconfiam de uma forma infinita das escolas”, conta Filinto Lima. “Há alguns pais que não veem a escola como um parceiro, veem como um adversário e o conflito agudiza-se.”

Para Jorge Nascimento, alguns dos problemas “vêm dos grupos de whatsapp dos pais, mais do que dos miúdos” que, muitas vezes, interferem com as discussões dos alunos e acabam com “um pai a pedir satisfações a outro pai”.

De repente, “está toda a gente envolvida nisto, quando aquilo seria uma coisa entre garotos”. E resolver o problema “entre garotos faz parte do crescer, de saber resolver conflitos, de saber estar com o outro”.

Os casos de Rita, Filipe e Gustavo não caem na fatia de conflitos de recreio que podem ser resolvidos sem a ajuda do adulto. Os três precisaram de ajuda médica, de ser medicados, e revelaram transtornos de saúde mental, como ansiedade, depressão ou fraca autoestima.

Rita está hoje mais integrada na escola, mas continua a precisar de medicação. Gustavo está sob vigilância médica e os pais, que ainda temem que possa fazer mal a si próprio, pensam pedir transferência para outra escola. Filipe encontrou sossego no colégio novo, mas para pagá-lo a mãe teve de dar a volta à sua vida profissional. Em nenhum dos casos é certo que as agressões tenham chegado ao fim.


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